quinta-feira, 28 de junho de 2007

Velocidades Radiais: Detectar um Planeta

Hoje aprenderemos a identificar um planeta pela analise do movimento induzido na estrela pelo planeta, aquando da sua orbita. Para uma revisão do fundamento fisico recomenda-se o post anterior Velocidades Radiais: Conceitos de Base ; uma simples animação fara recordar os mais esquecidos.

O primeiro ponto a realçar é que a estrela apresenta um movimento simétrico ao do planeta, segundo um factor de escala diferente devido a sua massa. O periodo da oscilação da velocidade radial da estrela em torno da sua velocidade média é igual ao periodo da orbita planetaria. Usando uma versão generalizada da 3a Lei de Kepler (que nos diz que a razão entre o semi-eixo maior de uma orbita ao cubo é proporcional ao quadrado do seu periodo; para mais ver Wikipedia: Leis de Kepler) podemos determinar o eixo-maior da orbita. Para alem disso, a amplitude da oscilação da estrela é proporcional a massa do planeta. Conhecidos o periodo e o semi-eixo da orbita a massa planetaria invisivel pode ser calculada. Assim, podemos recriar a orbita de um planeta e estimar a sua massa atraves da interpretação cuidada das oscilações estelares. Estimar e não medir, pois nos nao conhecemos a verdadeira inclinação do sistema. A amplitude da velocidade radial é medida multiplicada por um factor sin(i), em que i é a inclinação da orbita em relação a linha de visão. Este factor não altera o periodo nem o semi-eixo da orbita, mas surge na massa calculada que não é a massa do planeta mas massa do planeta x sin(i).


Tomemos um conjunto de medições de velocidades radiais, como este apresentado num press-release do ESO (imagens cortesia do mesmo e disponiveis em www.eso.org). Uma oscilação é ja aparente e ja podemos começar a testar o "fit" de varios periodos. No entanto, para obtermos uma melhor visualização da amplitude da oscilação podemos apresentar os pontos "em fase". Para tal estabelecemos um ponto de partida (e.g. data de inicio das observações), calculamos os multiplos do periodo a partir desse ponto e sobrepomos ao grafico. A posição ou "fase" de cada ponto no periodo é apresentada num grafico da oscilação estelar, que circula como prova da descoberta.



Espero que estejam convencidos que usar medidas de velocidades radiais para identificar um planeta não é uma tarefa conceptualmente complicada. Poupei-vos ao trajecto matematico (que interessaria alguns mas desencorajaria bem mais) mas as linhas vectoras estao aqui presentes. No entanto a grande dificuldade não é a interpretação dos dados, é a medição da velocidade radial de uma estrela com uma precisão que permita a detecção planetaria. Este assunto sera abordado no proximo post.

Encorajo os mais entusiasmados a experimentarem por si mesmos o "fit" de orbitas planetarias a partir de dados publicos. Sim, tal é possivel! Uma equipa liderada pelo astronomo Greg Laughlin desenvolveu uma aplicação chamada Systemic que vos permitira faze-lo pelas vossas proprias maos. O programa é acompanhado pelas medidas de velocidades radiais publicadas e a sua utilização é bastante simples. Para alem disso, o nivel de qualidade dos resultados e o conforto a nivel de utilização fez desta a ferramenta de eleição de alguns "caçadores de planetas". E quem sabe se um de vos nao descobre um planeta extra num cojunto de dados ja publico?

Espero bem que sim. Boa caçada. ;)

Pedro

segunda-feira, 25 de junho de 2007

Velocidades Radiais: Conceitos de Base

Para detectar um planeta extrasolar é necessario vencer varios obstaculos. Enquanto que as estrelas possuem uma fonte de energia interna, os planetas não, limitando-se a reflectir a radiação estelar que neles incide. Assim sendo a luminosidade da estrela-mãe é frequentemente 10 000 superior a do planeta que a acompanha.

Cientes das limitações impostas por estas dificuldades, os cientistas concentaram os seus esforços em detectar efeitos resultantes da presença do planeta em vez de luz proveniente do planeta. Esta é a diferença entre um método de detecção indirecto e um método directo, respectivmente.

Um conceito explorado segundo varias perspectivas foi o da atracção gravitacional estrela-planeta. Do mesmo modo que a estrela atrai o planeta, o planeta também atrai a estrela. Ambos os corpos vão rodar em torno de um ponto denominado centro-de-massa do sistema. Este é um ponto médio em que a contribuição de cada corpo para a média é pesada consoante a sua massa. O resultado é claro: o centro de massa encontra-se muito mais perto do centro da estrela que do centro do planeta. A título de exemplo, quando dizemos que os planetas no Sistema Solar orbitam em torno do Sol estamos a negligenciar o efeito da massa dos planetas para o cálculo do centro de massa do Sistema Solar. Para um sistema com 1 estrela e 1 planeta, o efeito é representado esquematicamente por esta animação.

Usando este princípio os astrónomos tentaram, durante muitos anos, detectar o movimento periódico no céu de algumas estrelas próximas, o qual indicaria a presença de um corpo em órbita à sua volta. Este método, designado Astrometria (a ser discutido num post futuro) é extremamente exigente a nivel tecnologico. As primeiras tentativas de detecção foram frustradas por minusculas oscilacões do telescopio que simulavam a presença de um planeta, ao fazerem as estrelas "oscilar" nas imagens.

Um outro método foi empregue. Desta vez o objectivo era medir a movimentação da estrela não no plano do céu (plano perpendicular a nossa linha de visão) mas na direcção radial (direcção da nossa linha de visão). Para tal foi usado o Efeito de Doppler. De acordo com o tal efeito, se uma fonte de radiação electromagnética apresenta movimento radial em relação a um observador então este detecta a radiação electromagnética com um comprimento de onda diferente do emitido. Este fenomeno ocorre com todas as ondas e é o responsavel pela variação do som da sirene de uma ambulancia a medida que passa por nos. Enquanto que as ondas sonoras se transformam em sons mais graves ou agudos, as ondas electromagneticas são detectadas como mais vermelhas ou azuis. Se uma estrela se afasta as ondas são mais vermelhas, se se aproxima, mais azuis.



Usando este método, Michel Mayor e Didier Queloz descobriram que 1 planeta com metade da massa de Jupiter orbitava a estrela 51Peg (no 51 da constelação do Pégaso). O mais estranho é que este planeta tinha um periodo orbital de 5 dias e encontrava-se a 0.05 U.A(Unidades Astronomicas; 1 U.A.: distancia média Terra-Sol)! Um planeta gigante a uma distancia ao Sol 8 vezes inferior a de Mercurio!
O bardo tinha razão: ha mais no céu e na Terra que a nossa parca filosofia pode sonhar.

Até em breve,

Pedro

terça-feira, 19 de junho de 2007

A definição de Planeta: o dominio Extrasolar

Um planeta extrasolar é definido da seguinte maneira:

Planeta Extrasolar - objecto com massa inferior ao limite de fusão do deutério que orbite uma estrela ou um remanescente estelar.

Esta definição foi estabelecida em 2003 pela WGESP (Working Group on Extrasolar Planets), e é utilizada com alguma flexibilidade. Guiada pelas observações e sujeita a modificações, é apresentada pela comissão como uma definição tentativa.

Debrucemo-nos um pouco sobre o significado da ausência de "fusão de deutério".
A fusão nuclear é a fonte de energia das estrelas( para mais ver Wikipedia: Fusão Nuclear ) . O Hidrogénio é o principal combustivel estelar e sustenta o colapso gravitico durante a maior parte da vida do astro.
O deutério é um isotopo do Hidrogénio, sendo constituido por um nucleo com 1 protão e 1 neutrão em vez de apenas 1 protão. A fusão de deutério ocorre a temperaturas inferiores as da fusão de Hidrogénio, sendo o elemento combustivel a mais baixa temperatura.

Quanto menor a massa de um corpo, menor a capacidade de gerar calor por contracção gravitica. Se calcularmos a massa necessaria para fundir deutério e Hidrogénio obtemos os valores de 13 e 85 vezes a massa de Jupiter, respectivamente. Os Planetas Extrasolares encontram-se abaixo do limite de 13 massas de Jupiter, não podendo assim "queimar" nenhum elemento. Os astros com massas compreendidas entre 13 e 85 massas de Jupiter podem fusionar deutério mas não Hidrogénio, sendo designados como Anãs Castanhas. Finalmente, os corpos celestes com mais de 85 vezes a massa de Jupiter podem queimar não apenas deutério mas tambem Hidrogénio: as estrelas. Como a fusão do abundante Hidrogénio fornece uma maior quantidade de energia, as estrelas são bem mais luminosas que as Anãs Castanhas.

Vale a pena assinalar que esta definição não inclui nenhuma alusão ao processo de formação de planetas. Esta preocupa-se em estabelecer um limite de massa superior e não inferior, como acontece com a caracterização de corpos no Sistema Solar. Para compreendermos porquê temos de conhecer o principal método de detecção de Planetas Extrasolares. O pragmatismo da definição sera então evidente.

Até em breve,

Pedro

segunda-feira, 18 de junho de 2007

A definição de Planeta: Sistema Solar

A definição de planeta foi amplamente comentada pelos orgãos de comunicação social no verão de 2006. Uma comissão da IAU (International Astronomical Union) foi criada para resolver um problema de ha muito: Plutão era designado planeta enquanto outros corpos do Sistema Solar, compartilhando das mesmas propriedades, não o eram. Este astro, que a principio se pensava ser maior que Mercurio, revelou-se como um dos muitos corpos hoje designados como Objectos Trans-Neptunianos. Segundo alguns astronomos, uma alteração impunha-se.
A 24 de Agosto de 2006 a IAU definiu que para que um corpo do Sistema Solar seja considerado um planeta deve satisfazer 3 propriedades:
  1. Deve orbitar em torno do Sol;
  2. Possuir massa suficiente para que a sua auto-gravidade o faça ter adquirido a forma esférica, quando em equilibrio;
  3. Ter limpo a sua vizinhança de detritos aquando do seu movimento orbital.
Verdade seja dita, não é das definições mais elegantes que a Ciência ja nos deu. Mas cumpriu o seu objectivo. Os pontos 2. e 3. merecem alguma atenção. O segundo reforça o facto que um planeta deve apresentar uma forma esférica, resultado de forte contracção gravitica, bastante claro em corpos massivos como a Terra. O terceiro ponto invoca a unicidade do planeta no seu movimento orbital, declarando que o planeta deve ter "varrido" a sua orbita por acção da força da gravidade. Plutão não satisfaz o ponto 3., sendo designado um "planeta anão". Todos os objectos, excepto satelites, que não cumpram 2. e 3. são rotulados de "pequenos corpos do Sistem Solar".

A utilidade desta definição é discutivel, sendo-o até o interesse da discussão em si. Um ponto é claro: não foi feita para os planetas extrasolares. Estes são todos os planetas que orbitam uma estrela que não o Sol. Ora a questão permanece aberta, e desta vez não poderemos socorrermo-nos de lugares comuns como a esfericidade de um planeta. A definição tera de operar a um nivel mais fundamental, e a sua discussão é bem mais instrutiva. Um tema digno de um novo topico, a rever amanhã!

Tudo de bom,

Pedro

domingo, 17 de junho de 2007

Planetas Extrasolares em Português

Saudações!

Em 12 anos, a detecção de planetas extrasolares passou de um objectivo longinquo a uma tarefa quase rotineira. Um novo campo de pesquisa foi aberto, estimulando a imaginação a cientistas e curiosos em geral.

Vivemos numa epoca conturbada. A Teoria da Evolução nunca reuniu um numero tão elevado de contestatarios. O orçamento atribu'ido a investigação decresce de ano para ano, com raras excepções para o conhecimento dito "aplicado". A percentagem de estudantes que envereda por uma carreira cientifica decresce de ano para ano. O numero de pessoas e dinheiro movimentado pelas "ciências ocultas" cresce freneticamente. Na era da Internet, a maioria dos resultados cientificos ainda parece escrito em grego para muita gente.

Este site nasce da convicção (perdoem-me a arrogancia) de que a Ciência é um bem da Humanidade. Assim, como investigador no tema de Planetas Extrasolares, farei a minha humilde parte. Apresentarei os mais recentes resultados de modo a que sejam compreendidos por todos. Responderei as perguntas (caso as haja) e tentarei esclarecer alguns pontos criticos pouco discutidos fora do meio. Os posts serão curtos e concisos, com o rigor cient'ifico dos trabalhos originais. Tentarei acrescentar varios posts por semana, a um ritmo naturalmente limitado pelas descobertas.

Espero conseguir transmitir-vos o fascinio pelo tema. Espero que passem a ver a Astronomia como algo vosso. Pura e simplesmente, espero que gostem.

A vos,

Pedro